Na noite da última quinta-feira (02), a psicóloga e assessora em saúde do SIMPE-RS Silvia Generali da Costa realizou a palestra online “Relacionamentos e afetos em tempos de coronavírus”. A atividade interativa teve a participação de cerca de 20 pessoas, que puderam participar de um bate-papo com a palestrante após a exposição inicial. Além desse momento, o sindicato também está disponibilizando horários semanais para atendimento individualizado com a psicóloga. Confira o artigo de Silvia Generali da Costa sobre o tema da conversa se ontem:
Relacionamentos em tempos de COVID-19
Por Silvia Generali da Costa
É inegável que a ameaça do COVID-19 e a quarentena necessária para sua contenção trouxeram mudanças para todos nós. A alteração de nossas rotinas diárias foi o primeiro grande desafio que tivemos que enfrentar e, somado ao medo, ao desconforto e à ansiedade que uma ameaça nos traz, estamos todos com os nervos à flor da pele.
Já falamos no texto anterior sobre a importância da rotina no confinamento, de forma que dedicarei este texto a uma breve reflexão sobre o que muda nos nossos relacionamentos e no nosso estado de espírito, muitas vezes, abalado, em tempos de COVID-19.
Nesta reflexão, parto do pressuposto de que estamos com nossos ânimos alterados e que a quarentena pode INTENSIFICAR, MODIFICAR e MELHORAR nossos modos de agir e de reagir frente à ação e à reação daqueles que nos são próximos. Isto quer dizer que a quarentena e a ameaça do vírus altera nosso modo habitual de convivência. A forma como isto acontece depende de inúmeros fatores. Vamos a eles.
Acesso e familiaridade com tecnologias de informação e de comunicação.
Aqueles que se veem obrigados a trabalhar em home office sem contar com a estrutura ou com a habilidade necessárias para tal, enfrentarão dificuldades adicionais na quarentena. As instituições não podem assumir que todos os trabalhadores possuem computador, impressora multifuncional, internet e uma sala exclusiva para o trabalho. Para trabalhar em home office é necessário definir um horário, um local e as condições técnicas de acesso. Aprender novas tecnologias também pode gerar ansiedade. Estas situações e as definições exigidas nos levam aos pontos seguintes, que são o apoio dos colegas e a estrutura familiar.
Apoio dos colegas e chefias.
É no momento em que necessitamos desenvolver novas habilidades e que nossas rotinas de trabalho se alteram substancialmente, que precisamos do apoio daqueles mais próximos à tecnologia. Nesta situação de dificuldade, o contato, a disponibilidade e a empatia dos colegas e das chefias serão uma oportunidade de estreitamento (ou não) de nossos laços de colaboração e de amizade no trabalho. Mostrar-se disponível, com abertura para aprender e para ensinar, é o que dará o tom dos afetos no retorno ao trabalho presencial.
Apoio entre familiares
Muitos de nós contavam com babás, escolinhas, colégios, diaristas ou empregadas para dividir o cuidado com os filhos e as tarefas domésticas. Agora, temos marido, esposa e filhos juntos em tempo integral. Quem ajuda as crianças nas tarefas domésticas? Quem limpa a casa? Quem faz o almoço e lava a louça? Quem faz as compras de mercado? Estas novas demandas exigem da família uma (re)negociação de tarefas. O sucesso nesta negociação, sem sobrecarga a nenhum dos responsáveis pela casa e sem ressentimentos pode fortalecer as relações entre o casal e incentivar atitudes de maior responsabilidade entre crianças e adolescentes, dentro dos limites que suas idades impõem.
Ausência de familiares
O trabalho é fonte primordial de contato social. Para quem reside sozinho, home office pode significar isolamento e angústia e intensificar o medo da doença e da falta de alguém que nos cuide e proteja. Aqui o uso das tecnologias de comunicação para que não se perca o vínculo com amigos, colegas, parentes e vizinhos é fundamental. Não hesite em contatar. Lembre que os outros também podem estar se sentindo sozinhos e precisar de você.
Características pessoais
Aqueles acostumados à vida social intensa e aos esportes ao ar livre provavelmente sofrerão mais com a quarentena. O desafio para estes de encontrar fontes de distração e de alegria dentro dos limites das paredes do lar, será bem maior do que para aqueles afeitos à leitura e às séries de TV, sem o hábito de sair para bares e restaurantes. Aqueles perfeccionistas talvez sofram mais com a quarentena porque se exigirão trabalho em dia, casa brilhando, filhos alegres e cônjuge satisfeito, porque afinal, há tempo para isso – como se tudo isto dependesse somente de tempo livre. Aqueles que já vinham deprimidos também poderão sofrer mais com o isolamento, a autoexigência, a incerteza e o medo.
Então, independente de sua situação ou características, penso que as atitudes a seguir podem lhe ajudar a suportar este período difícil.
- Aceite que é preciso tempo para adaptação.
- Não se exija perfeição e metas excessivas só porque você dispõe de tempo.
- Mantenha o contato virtual com amigos, parentes e vizinhos. Lembre-se daqueles com os quais você nunca tinha tempo para conversar.
- Estabeleça uma rotina, negociada com os familiares.
- Aprenda novas habilidades, sobretudo aquelas que lhe dão prazer.
- Estabeleça limites para tudo: acesso a notícias sobre o vírus, brincadeiras com os filhos, tempo dedicado às tarefas domésticas, tempo de trabalho em casa. Reserve um tempo para você mesmo.
- Tente manter o corpo e a mente ativos.
- Mostre empatia e espírito de colaboração.
- Pense no que realmente é essencial e importante para você neste momento e no futuro. O que você quer preservar e o que você não sente tanta falta.
A incerteza, a ansiedade e o medo passarão, assim como esta pandemia. O que pode restar, pode ser algo bem melhor do que temos hoje.